10 novembro, 2009

100 Jabá

Por Gilberto Dimenstein


Telma Queiroz suspeita que não seguiu a carreira de cantora porque não teve apoio familiar. Formou-se em direito na PUC-SP e passou a viver da advocacia -mas, agora, aos 44 anos, seu prazer é abrir espaço para bandas.Trabalhando nas áreas cível e comercial, Telma nunca deixou de lado, mesmo que por vias tortas, a atração pelos palcos. Teve uma empresa de locação de som e luz para espetáculos, além de organizar festas infantis. O holofote no fim do túnel veio quando assistiu, como ouvinte, às aulas de um curso de rádio na USP. "Descobri que poderia montar minha própria rádio."Nascia, assim, a experiência de uma rádio por internet chamada 100 Jabá -uma rádio que acabou, literalmente, na rua. Desde menina, organizava festivais na escola que estudava e, sempre que podia, cantava nas festas. Vivia atrás dos roqueiros que tocavam nos galpões da Barra Funda. Lembra-se, em particular, do teatro Lira Paulistana, um porão em Pinheiros que, no mês passado, completaria 30 anos e onde se reunia a vanguarda musical da cidade, como Itamar Assunção. Foi ali o primeiro concerto dos Titãs. "Dá uma saudade de doer daquele porão de doidos talentosos." O porão, onde tanta gente passou tanto calor, abriga hoje uma empresa de alimentos congelados.Aos poucos, a vida a levaria de novo para a música -e graças à vanguarda tecnológica.O primeiro parceiro de Telma foi Alexandre Teixeira, que, por sofrer de distrofia muscular, só move dois dedos. Mas, autodidata, tinha todos os conhecimentos técnicos para montar uma rádio na internet. O que sobrava de vontade, faltava em dinheiro para o projeto. "Fomos à procura de bandas e cantores que queriam se apresentar, mas não conseguiam abrir as portas das rádios comerciais", conta Telma. Daí veio o nome 100 Jabá.No começo, eles foram encontrando os músicos pelos sites da internet, especialmente o MySpace. A partir deste ano, a experiência deixou o virtual -e, com ela, Telma aprendeu a conhecer os locais mais distantes de São Paulo.Com apoio de um programa municipal de seleção de projetos culturais (VAI), a 100 Jabá teve recursos para transmitir ao vivo bandas emergentes em espetáculos organizados em praças e parques na periferia -muitas vezes, é possível revelar os talentos locais. A rádio tem hoje um acervo de mil bandas, vindas de todo o país. "Só pode entrar quem tiver composições próprias, nada de cover." Seu projeto é lançar um CD com seleção das obras de algumas dessas bandas e lançá-lo por diversos palcos alternativos da cidade.Sem saber, ela foi reconstruindo aquele porão encantado de talentos.PS - O endereço da rádio é http://www.100jaba.com/. Aliás, está sendo preparado um documentário, de Ribas de Castro, para descongelar as imagens do que se passou no Lira Paulistana.